Concer superfatura obra da Serra em R$ 400 milhões

Diário de Petrópolis – 4/9/2016

Auditoria do TCU termina apontando superfaturamento de R$ 70.4 milhões, sobrepreço e ineficiência na Nova Subida da Serra

Eric Andriolo/Edson Cunha

O relatório da auditoria do Tribunal de Contas da União está finalizado e aponta uma série de irregularidades nas obras da Nova Subida da Serra. Segundo o documento, existem “indícios de irregularidades graves na autorização e execução das obras pela Concer”. O principal problema foi o superfaturamento da obra. Ao encaminhar o relatório, o diretor da Secretaria de Infraestrutura Rodoviária, Fabio Amorim, afirma que “os vícios de legalidade e legitimidade carregam indícios de sobrepreço significativo dos valores acordados entre a ANTT e a Concer; tais valores, se atualizados em 2016, chegam a relevantes R$ 400 milhões”.

As principais constatações da auditoria foram: sobreavaliação do valor do reequilíbrio econômico-financeiro no fluxo de carga marginal decorrente da superestimativa de alíquota de IRPJ e CSSL, sobrepreço no orçamento da obra; projeto básico e executivo desatualizados e deficientes; existência de atrasos significativos em obras e serviços; fiscalização e supervisão deficiente ou omissa e impropriedade na execução orçamentária.

Em valores de abril de 1995, a equipe de auditoria apontou sobrepreço de R$ 62,1 milhões, dos quais R$ 15,8 milhões já foram pagos indevidamente à Concer (o aporte seria dividido em três parcelas, a primeira das quais já foi paga). Em valores referentes à data-base do orçamento (maio de 2012), o sobrepreço chega a R$ 203,8 milhões, e o superfaturamento, R$ 51,8 milhões.

Em valores corrigidos, o superfaturamento seria de 70.4 milhões.

A fiscalização da obra é responsabilidade da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), que firmou o contratod. A Nova Subida da Serra é a nova pista da BR-040. A rodovia está concedida à Concer, no trecho entre Rio de Janeiro e Juiz de fora.

Autor de representação ao TCU sobre as obras da Nova Subida da Serra, o deputado federal Hugo Leal (PSB-RJ) afirmou que a auditoria confirma as irregularidades no 12º termo aditivo do contrato de concessão da BR-040:

“As constatações dos técnicos do TCU mostram um verdadeiro escândalo: valores superestimados, sobrepreço, atrasos nas obras e nos serviços. É fundamental que o tribunal continue apurando as irregularidades na concessão”, disse o deputado.

Segundo o relatório, o sobrepreço aconteceu através de aumentos em valores previstos em lei. O termo aditivo calcula, por exemplo, que o imposto de renda a ser pago pelo consórcio seria 25%, quando a legislação prevê 15%. “Ou houve total incompetência ou má fé”, criticou Hugo Leal.

Também há superestimativas em outras alíquotas, como o cálculo adicional de imposto de renda, da contribuição social sobre o lucro líquido, da base de cálculo do IRPJ e da CSSL e do cálculo do ISSQN, todos em desacordo com a Lei.

O 12º termo é o que define que a União deveria pagar a maior parte do custo da obra, e que estabelece a prorrogação do contrato caso o Governo Federal não cumpra com a obrigação. Por causa da crise, o governo não pagou a segunda parcela do aporte, que deveria ter sido entregue em dezembro do ano passado.

Como o pagamento não foi feito, a concessão da Concer, em teoria, já estaria estendida em seis anos e meio, terminando em 2027. Mas o termo aditivo já tem sua legalidade questionada pelo Ministério Público, que chegou a conseguir uma anulação na justiça em 2015. No entanto, a decisão era liminar e foi cassada por uma instância superior.

A fiscalização 379/2015 do TCU começou quando as obras da Nova Subida da Serra estavam praticamente paralisadas. O secretário de Fiscalização da Infraestrutura Rodoviária do TCU, André Luiz Vital, lembra, em despacho ao ministro Walton Rodrigues, relator do processo, que o atraso no cronograma de obras começou em 2014 e houve “significativa ampliação dessa morosidade”, em 2015.  Vital defendeu o aprofundamento das investigações.

Deputado vai a comissão, PGR e MT

Leal pretende aplicar mais pressão contra a Concer após esse relatório. O deputado disse ao Diário que já enviou o relatório à Comissão Mista do Orçamento, na Câmara dos Deputados, para “comprovar que é impossível passar quaisquer recursos para essa obra. O deputado também marcou reuniões com o Executivo e o Ministério Público. Nas próximas semanas, ele se reunirá com o Ministério dos Transportes e com a Procuradoria Geral da República, para discutir ações legais contra as concessionárias.

“Se eu fosse a Concer eu pedia para sair”, disse o deputado, que defende que haja nova licitação para a via. Leal disse também que, após o caso da Concer, vai passar a defender o fim dos contratos que prevêem, ao mesmo tempo, a exploração das vias e a realização de obras pela mesma empresa.

“Quando comparamos as concessões com as obras públicas, vemos que a concessão fica muito mais cara. Nada contra a privatização, mas vou começar a defender isso em Brasília. Agora, quando envolver obras, tem que haver uma situação a parte”, concluiu.

Relatório pode embasar ação contra empresa

O ex-presidente e atual secretário-geral da Subseção da Ordem dos Advogados do Brasil em Petrópolis, Herbert Cohn, disse ao Diário que a auditoria do TCU tem força suficiente para rescindir o contrato da Concer:

– O relatório do TCU tem grande fundamento e o parecer serve para ajuizar uma Ação Civil Pública, Ação Popular ou ainda pedida pelo Ministério Público. Com certeza a situação pode ser revertida – afirmou o advogado.

Para Herbert, o fato de o relatório ter encontrado sobrepreço, valores superestimados e atrasos na obra podem ser cruciais para a rescisão do contrato:

– Com certeza a Justiça pode ajudar e muito a população neste assunto – garante.

Prorrogação

O relatório chega em momento de debate sobre a possível prorrogação do contrato da Concer pelo Governo Federal. A justificativa seria que a prorrogação poderia possibilitar a conclusão das obras da Nova Subida da Serra.  A ANTT já defendeu a prorrogação das concessões de rodovias federais no Rio de Janeiro.

No mês passado, no entanto, o Ministério dos Transportes desistiu de renovar antecipadamente as concessões de rodovias federais no Rio. Tanto a Concer quanto a Nova Dutra (BR-116/RJ-SP) foram afetadas. O motivo foi justamente a resistência do Tribunal de Contas da União (TCU), que detectou irregularidades nas vias e alega que as empresas não cumpriram as metas previstas em contrato. A concessão da Concer começou em 1996, e é vigente até 2021.

Mesmo assim, o governo Temer está pensando em forçar a prorrogação através de Medida Provisória. Essa medida, que está sendo montada pelo Executivo federal, iria unificar as regras de prorrogação dos contratos de concessão, que hoje são definidas por diferentes agências. A ideia é acabar com os conflitos com a justiça.

Mesmo não estando claro, ainda, se essa MP irá facilitar uma futura prorrogação dos contratos, o secretário do Fomento do Ministério dos Transportes, Dino Batista, teria dito na ocasião que estuda prorrogar a concessão Concer para garantir que a obra da Rio-Petrópolis seja concluída para reduzir o número de acidentes na via, mas que ainda “não há acordo” sobre como fazer a prorrogação.

O deputado Hugo Leal critica as tentativas de prorrogação. Ele disse esperar que as irregularidades constatadas pelo TCU sirvam para que a ANTT e o Governo desistam de vez de ampliar o prazo de concessão da Concer: “Não há razão para prorrogar o a concessão já que a concessionária não cumpriu o contrato e sequer concluiu a Nova Subida da Serra, obra em que o TCU constatou claros indícios de superfaturamento”, destacou o deputado do PSB.

Auditoria inédita

Foi a primeira vez que o TCU fez uma abordagem desse tipo em um contrato de concessão. Foram analisados os custos da obra, a qualidade do projeto e os seus custos. Isso porque a ANTT e o Ministério dos Transportes firmaram o 12º termo aditivo prevendo aporte de recursos diretamente do Orçamento Geral da União.

Outros processos

O Ministério Público está investigando a legalidade do termo aditivo

EM QUADRO SEPARADO

Sobrepreço e superfaturamento

Os dois termos significam coisas diferentes. Segundo o Acórdão nº 310/2006 do TCU, “o Sobrepreço ocorre quando uma cotação de um bem ou serviço é superior ao valor praticado pelo mercado”. Já o Superfaturamento ocorre após a liquidação das despesas, ou seja, depois da aquisição, faturamento e pagamento de um bem ou serviço.

Segundo o tribunal, o sobrepreço da obra foi de R$ 400 milhões e o valor superfaturado foi de R$ 70.4 milhões.

Comentários às Finanças Municipais de Petrópolis

[Comentários de Fernando Varella(*), agosto/2016]

  1. O orçamento de Petrópolis está há 3 anos patinando no patamar de R$ 800 milhões. Em 2017 deverá ser de R$ 900 milhões;
  2. Na década de 80, Petrópolis tinha um orçamento que situava o município entre os 20 maiores, fora as capitais. O nosso orçamento era próximo ao de Juiz de Fora, Uberlândia, Niterói, São Carlos, Maringá, Londrina, Blumenau, Sorocaba, Guarujá, Joinville;
  3. Hoje, não estamos incluídos na lista dos 100 maiores, fora as capitais, identificando que Petrópolis ficou para trás em termos de orçamento municipal. Exemplos: Juiz de Fora, atualmente, tem um orçamento de R$ 1,9 bilhão; Maringá 1,4 bilhão; Joinville R$ 2,2 bilhões; Uberlândia R$ 2,0 bilhões; Londrina R$ 1,5 bilhão e Blumenau R$ 2,5 bilhões;
  4. O descompasso também pode ser observado na comparação entre PIB e orçamento. O PIB de Petrópolis, segundo o IBGE, foi de R$ 9,460 bilhões, em 2013 (o 84º. maior do país), com uma estimativa de R$ 10,6 bilhões para 2015 (provavelmente se mantendo entre os 80 maiores PIBs municipais. Desse modo, o orçamento municipal do nosso município corresponde a 8% do PIB, enquanto o de Juiz de Fora (R$ 13,6 bilhões) corresponde a 15% e o de Blumenau (R$ 12,5 bilhões) é igual a 20% do PIB do município. Nesse quesito Petrópolis também fica muito atrás de outros municípios;
  5. Em função do seu acanhado orçamento, a administração municipal de Petrópolis, nos últimos anos só tem conseguido investir um percentual da ordem de 3% (R$ 25 milhões) a 5% (R$ 40 milhões) do orçamento, percentuais insignificantes, tendo em vista às necessidades e demandas da população local. Não é por outra razão que segundo a Firjan, o Índice Firjan de Gestão Fiscal relativo ao ano de 2014, Petrópolis ocupava a 79ª posição. Somente 5 dos 84 municípios do Estado do Rio, tem índice pior. O índice do nosso município relativo a 2015 melhorou um pouco, mas, ainda, ficamos longe dos melhores colocados. O Índice Firjan leva em conta 5 variáveis: receita própria, gastos com pessoal, investimentos, liquidez e custo da dívida;
  6. Tendo em vista as demandas da população local, a situação de alguns segmentos de atuação municipal, como mobilidade urbana, manutenção viária e rede municipal de saúde e educação, se deteriora nos últimos anos. A administração municipal de Petrópolis precisaria contar com recursos mínimos, para investimentos, da ordem de R$ 200 milhões/ano, para atender às muitas demandas da população, no âmbito de um orçamento anual mínimo, entre R$ 1,3 bilhão e R$ 1,4 bilhão;
  7. É de se destacar que a posição do endividamento contratado da Prefeitura é muito baixa, correspondendo a menos de 1 mês de receita, significando que a administração municipal não tem buscado com regularidade operações de crédito junto às grandes instituições financeiras públicas como BNDES, Caixa Econômica Federal, Finep, CNPq, e, até internacionais, como o Banco Mundial e o BID. Por outro lado, com base nas receitas extra orçamentárias registradas nos balanços anuais da Prefeitura, verificamos que a administração municipal também não vem obtendo recursos significativos junto aos ministérios e agências do governo federal, e/ou não tem tido a competência de fazer bons projetos com a devida viabilidade técnica e financeira para serem aprovados por aquelas repartições;
  8. Blumenau e Juiz de Fora vêm registrando nos seus orçamentos, uma participação média de 20 a 25% de receitas não orçamentárias, oriundas de repasses de recursos por parte dos outros entes da federação e/ou de operações de crédito, possibilitando a elevação dos investimentos públicos por parte daquelas administrações municipais. Somente junto ao BID – Banco Interamericano de Investimento, a atual administração de Blumenau conseguir obter recursos do BID, da ordem de US$ 105 milhões, receita extra-orçamentária superior a R$ 300 milhões, destinados ao Programa Blumenau 2050, definido no âmbito de um planejamento estratégico, com visão de futuro, realizado com ampla participação da população;
  9. Outro registro importante é com relação à composição do orçamento municipal. A cada ano vem aumentando a participação das receitas transferidas de outros entes da Federação: União e Estado do Rio de Janeiro. Este ano, a participação das receitas transferidas é quase 70% do orçamento, identificando uma perigosa dependência e situação nada confortável. Por outro lado, o crescente aumento da participação de receitas transferidas nos últimos anos, identifica que a Prefeitura está ficando para trás na cobrança dos tributos de sua competência;
  10. Não é por outra razão que os níveis de remuneração do funcionalismo municipal de Petrópolis são extremamente baixos;
  11. Com relação às receitas próprias chama atenção a reduzida arrecadação do ISSQN, representando uma pouca expressiva participação na receita total da Prefeitura. A quase totalidade dos municípios que integram a lista dos de maior PIB do país, tem um percentual de participação do ISS na sua receita total, muito maior do que a de Petrópolis;
  12. Ainda no meu entendimento, o planejamento de ações no sentido da Prefeitura de Petrópolis aumentar sua arrecadação, deveria ter 3 focos principais:

a)     Definição de projetos prioritários, definidos a partir de um planejamento macro e adequados estudos de viabilidade, para a busca de recursos de financiamentos, junto às agências de crédito governamentais, brasileiras e internacionais, sempre com juros baixos e longos prazos de pagamento;

b)     Do mesmo modo, identificação de projetos enquadráveis nas áreas de atuação dos diversos ministérios e agências dos governos federal e estadual, para obtenção de repasses de recursos;

c)     Implementar a meta de dobrar a curto prazo a arrecadação do ISSQN, através de pequenas alterações e ajustes na legislação tributária municipal, bem como no treinamento adequada do corpo de fiscais da Secretaria Municipal de Fazenda.

* Fernando Varella é diretor da NovAmosanta

O Parque Serra da Estrela, Unidade de Conservação Proposta pela NovAmosanta

Jandaia-de-testa-vermelha (Aratinga auricapillus) - Foto National Geographic Brasil

por Fernando Varella(1) – NovAmosanta

A NovAmosanta vem desenvolvendo ações no sentido da criação de uma nova unidade de conservação na Serra de Petrópolis, o Parque Serra da Estrela. O novo parque abrangeria as atuais subida e descida da Serra, com uma visão de que a atual estrada passa por um importante trecho da Mata Atlântica que, além da sua beleza natural, abriga uma riquíssima flora e fauna que todos os petropolitanos têm a obrigação de preservar. Além disso, a subida da serra é um dos mais importantes ativos turísticos do município, sendo, certamente, um importante atrativo para os visitantes que vem a Petrópolis.

A preocupação da NovAmosanta em defender, junto à ANTT, a criação do novo parque, é possibilitar a preservação da atual subida da Serra e impedir invasões ao longo da estrada, situação que poderia ocorrer caso o trecho de subida ficasse sem destinação e/ou, caso a Concer decidisse implantar mão dupla de tráfego até o Belvedere, após a inauguração da nova subida da Serra.

Mata Atlântica - Foto Site IBAMA

A criação dessa nova unidade de conservação ligará a Reserva Biológica Federal do Tinguá à Reserva Biológica Estadual de Araras e ao Parque Nacional da Serra dos Órgãos, formando um importante corredor ecológico. A proposta teve forte impacto junto às entidades de preservação ambiental e à sociedade civil organizada local. Uma das primeiras instituições a se engajarem nessa proposta foi o INEA – Instituto Estadual do Ambiente, cujo presidente, Marcus Lima, já manifestou publicamente seu compromisso de defender o trecho de Mata Atlântica cortado pela rodovia de acesso à Petrópolis.

Esse esforço, entretanto, não conflita com os esforços da nossa ONG na defesa da continuação da obra da nova subida da Serra e de outros ações, visando mais conforto e na defesa dos interesses dos usuários da rodovia, como  maior segurança, uma melhor manutenção compatível com o alto valor da tarifa, especialmente do trecho de subida da Serra e, ainda, melhores acessos às comunidades ao longo da rodovia, especialmente em Itaipava, assuntos que há muito tempo vem merecendo a atuação da NovAmosanta em diversos fóruns.

(1)  Fernando Varella é diretor da NovaAmosanta e nos representa, junto com Jorge de Botton, no Grupo Paritário de Trabalho – ANTT/Concer.

Ver também:

Fotos de 20 animais da Mata Atlântica (National Geographic Brasil)

Sobre a Reserva ou a Estrada-Parque neste Blog

Ibama – Mata Atlântica

Importância do Corredor Ecológico (oEco)